terça-feira, 19 de abril de 2016

Os palhaços do Congresso, um reflexo da sociedade (Por Thiago Muniz)

Por menos estado na economia, por austeridade fiscal, pelo fim do uso de ministérios como moeda de troca, que transformou a Esplanada numa comédia de mau gosto, eu votaria sim.

Mas “pelos militares de 64″? “Pelo ‘Grande Arquiteto do Universo'”? “Pela minha família”?, “Pelo Coronel Ustra”?, “Pela nação evangélica”? “Pela paz em Jerusalém”?, “Pelo povo da minha linda puta-que-o-pariu?”

Vergonha desse obscurantismo.

Mas uma coisa me deixa feliz, porque houve um momento histórico ontem. Não exatamente o impeachment, já que este nem é o primeiro de uma geração que ainda lembra bem do último.

Histórico mesmo foi a população inteira ter passado o domingo ouvindo cada um dos deputados discursar, e então constatarmos todos que ferrou, que a Câmara hoje é uma versão mal roteirizada da Escolinha do Professor Raimundo. Uns 300 Tiriricas com crachá de “autoridade”.

Isso coloca no mesmo barco quem até agora vinha cruzando o mar em naus diferentes.

A minha embarcação é o dos que defendem o seguinte: que a estrada para o bem-estar comum é a do empreendedorismo individual, do livre comércio, do fim das estatais. O outro barco, que eu vejo a bombordo aqui do meu convés, é o que entende o empreendedorismo estatal, em suas diversas formas, como o caminho para a diminuição da desigualdade.

O objetivo mais concreto dos dois barcos é o mesmo: exterminar a miséria, promover uma vida digna para a população inteira. Mas as vias são tão díspares que na maior parte das vezes as tripulações dos dois barcos, o da esquerda e o da direita, passam boa parte do tempo atirando bolas de canhão um contra o outro no oceano dos debates.

Mas hoje é um dia especial. A acefalia explícita do congresso uniu os nossos barcos: tornou-se o inimigo comum. Ficou nítido que o grosso do parlamento não representa porcaria nenhuma além da própria família – daí as citações infinitas a cônjuges, mães, filhos.

Até porque que o “bem da família” é a grande justificativa para que boa parte deles roube. Temos um congresso de Walter Whites – sujeitos que usam a família como desculpa moral para seus ilícitos.

Não é exagero: dos 108 congressistas mais votados, 40 são investigados pela justiça – entre eles, claro, Eduardo Cunha, o vigésimo mais votado.

Um índice de 37%. É como se o Congresso tivesse tantos criminosos de fato quanto o SISTEMA PRISIONAL – caso descontarmos da população de criminosos do sistema prisional quem está ali mais pelo delito de ser preto e pobre do que pela transgressão que realmente cometeu.

Mas talvez eles representem ainda menos a população de eleitores. O próprio site da Câmara informa que apenas 36 dos 513 deputados obteve o mínimo de votos necessários para assegurar um assento.

Os outros 477 foram puxados por votos dados para suas legendas, coligações e para os candidatos desse Top 36, já que o sistema permite que o “excedente” de votos de um candidato seja redistribuído pelo partido dele – Temer só foi eleito deputado em 2006 graças a essa contabilidade eleitoral.

São 477 deputados nessa situação. Ou seja: 93% do Congresso foi eleito assim, de forma indireta. Noventa-e-três-por-cento.

E entre os 7% eleitos “de verdade”, o que temos é a filha do Garotinho, o neto do Covas, Tiririca, Maluf, pastor isso, apóstolo aquilo. Nosso sistema consiste basicamente em celebridades, herdeiros de sobrenomes e líderes religiosos puxando votos para a nanicada.

Na próxima eleição, deve chover Youtuber nesse papel – uma mudança fundamental para que nada mude.

E tudo isso só existe porque é quase impossível votar para deputado. Escolher um sujeito entre os milhares de candidatos é tão complexo quanto concluir uma tese de doutorado. Não surpreende, então, que na hora de votar, não venha ninguém na mente do eleitor que não seja o filho de fulano, o pastor da televisão ou o Tiririca.

Se o voto fosse distrital, cada eleitor teria de escolher a partir de uma lista com 20, 30 nomes.

Concorde você com voto distrital, com voto proporcional, com mais estado, com menos estado, numa coisa nós concordamos: as feridas do país continuam sangrando, a começar pelas do próprio grupo que está assumindo o poder, com o rejeitado Temer à frente mais Cunha, um delinquente serial, na “articulação política”.

A solução mais redonda aí seria convocar eleições presidenciais em outubro. Mas, como Temer não consegue votos nem para se eleger deputado por conta própria, as urnas não lhe interessam.

Cabe a nós, então, exigir um novo pleito e um sistema eleitoral mais eficiente, porque não são esses 300 Tiriricas que vão fazer isso.

As pessoas não deveriam ir as ruas contra ou a favor, dividindo suas forças e agredindo umas as outras, quando teoricamente querem a mesma coisa, o fim da corrupção (utopia nesse país). O que existe no Brasil há anos e que chegou em seu ápice, é a crise política.


Há anos estamos elegendo pessoas que não fazem nada pelo bem do país, mas sim pelo bem pessoal e de seus partidos. Pelo bem dos empresários que depositam certo montante de dinheiro em suas contas todos os meses.

As pessoas deveriam ter se juntado e manifestado para que fosse feita uma reforma política. Que fossem realizadas novas eleições. Ou simplesmente exigissem a cassação e/ou renúncia dos envolvidos e acusados na operação Lava-jato.

Por fim, acredito que é decepcionante ver pessoas como o Cunha promovendo a abertura do processo de impeachment ainda mais do que é ter a Dilma como presidente que foi votada pelos 54 milhões de votos que você descreveu abaixo. Principalmente por que o PT e o PMDB, sua principal base aliada, vão continuar no poder. Mas que fiquemos com esse falso gosto de vitória na boca.











BIO

Thiago Muniz tem 33 anos, colunista dos blog "O Contemporâneo", do site Panorama Tricolor e do blog Eliane de Lacerda. Apaixonado por literatura e amante de Biografias. Caso queiram entrar em contato com ele, basta mandarem um e-mail para:thwrestler@gmail.com. Siga o perfil no Twitter em @thwrestler.

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