Até que ponto a intenção de brincar ultrapassa o ato de ofender?
Um dos melhores atletas da seleção brasileira de ginástica – o único negro da equipe – viajou junto com a delegação para o Rio de Janeiro, para a disputa da Olimpíada Rio-2016, mas teve que se contentar em torcer pelos companheiros das arquibancadas.
Arthur Nory Mariano gravou um Snapchat, com outros dois ginastas brancos, fazendo duas piadas racistas contra Angelo, que estava no mesmo ambiente. Ele disse, gargalhando, que o saco do supermercado é branco, e o de lixo, preto; e que a tela do celular quando quebra fica da cor preta. Angelo ficou abalado. Como qualquer negro ficaria. Como qualquer branco também deveria ficar. Ou, no mínimo, constrangido.
Por coincidências que sempre se repetem em casos de racismo no Brasil, quando racistas são apanhados em flagrante, a vítima do racismo, Ângelo Assumpção, foi quem acabou não participando das olimpíadas de 2016, devido às mudanças das regras para escolha dos participantes, dizem as autoridades esportivas.
Desde então, a Confederação Brasileira de Ginástica decidiu punir. Decidiu punir a vítima, como sempre. Armou um vídeo com pedido de desculpas, com os quatro ginastas no quadro. Decidiu apaziguar. Angelo foi quase coagido a não registrar Boletim de Ocorrência contra Arthur, que praticou o crime inafiançável de racismo.
Houve todo um trabalho de mídia para mudar a imagem do atleta racista. Primeiro, Arthur não é mais Nory, é Mariano. Saiu em todas os jornais, portais e emissoras de televisão como o galã brasileiro. E, mais patético ainda, foi o suposto affair dele com uma atleta americana negra. Com entrevistas dizendo que são “crush”. Um trabalho global digno de Oscar, daqueles que se faz com ator galã da emissora carioca, praticamente uma força-tarefa de valorização (falsa) da imagem.
Apesar de tudo isso. Depois de sofrer crime de racismo, ser pressionado para calar a boca e ser cortado da Olimpíada realizada no seu próprio país, Angelo nos dá uma lição. Em uma foto postada em seu Instagram, ele diz: “Foi um ano muito difícil pra mim , um ano que tive que superar várias dificuldades e aceitá-las. Tudo passa… Ontem fui assistir [sic] a ginástica que continua crescendo e sempre dando orgulho para todos os brasileiros. Parabéns pra todos os atletas e continue com o trabalho duro.”
Sangue frio e classe contra o racismo. Mas, ao mesmo tempo, é possível ver em seu olhar a vontade de, um dia, quem sabe, talvez, ainda representar bem – como sempre representou – o Brasil na Ginástica artística.
O que Arthur (Nory) Mariano já fez pelo Brasil? O que ele fez pra merecer disputar as olimpíadas, além de ser branco?
Em tempo, Nory (Mariano) ganhou a medalha de bronze no solo individual na Rio 2016. Esportivamente falando foi merecido, mas tenho certeza que o Ângelo brigaria pelo ouro, uma pena, uma lástima.
Thiago Muniz tem 33 anos, colunista dos blogs "O Contemporâneo", do site Panorama Tricolor e do blog Eliane de Lacerda. Apaixonado por literatura e amante de Biografias. Caso queiram entrar em contato com ele, basta mandarem um e-mail para: thwrestler@gmail.com. Siga o perfil no Twitter em @thwrestler.
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